Texto: Bruna Obadowski
Fotos: Henrique Santian
De dois processos singulares nas suas potencialidades individuais, nasce o registro “a simbiose de maiêutica”. De um lado, Henrique Santian na sua particularidade no olhar para com as artes visuais, do outro Raquel Mützenberg, com sua potência crítica se re-inventando nas artes cênicas.
A série fotográfica traz de forma sutil e singular maiêutica, numa mistura de cores e não-cores que explora de forma intensa muitas das particularidades do trabalho de Raquel e de Santian. Dessas particularidades, parte o antagonismo de ambos os artistas, materializando em fotografia as mais variadas formas de se colocarem politicamente no contexto social dentro de seus processos criativos.
O registro de Santian, parte da premissa de demonstrar de forma singular maiêutica em sua estética particular na fotografia. Há aqui, uma reverência a potência da intervenção, que diante da natureza espetacular de Chapada dos Guimarães no fim de tarde, toma corpo e ganha vida, desde a montagem do corpo compartilhado entre o animador e o boneco, assim como nos passos e nos movimentos construídos entre os dois que agora é um.
No cerne da fotografia de Santian está Maiêutica, fruto de um processo criativo durante o mestrado de Raquel. Trata-se, portanto, não somente de uma boneca que ganha vida, mas que também, na sua particularidade feminina, concebe vida. Há, diante dessa grande intervenção cênica uma forma particular e política de reinvenção de quem cede parte do corpo para compor um novo corpo. Há muito mais que que os 30, 40 ou 50 minutos de parto durante a cena.
Há aqui, atravessado nas fotografias e nos espaços que Raquel perpassa com a performance, uma critica social as intervenções desnecessárias e dilacerantes inseridas no processo de parir , as formas (equivocadas ou a falta) de assistência a saúde feminina durante o parto (este que historicamente, trata-se de um processo doloroso e agora, emergente no seu campo de estudo), além de um grande eixo motivador possibilitando a reflexão de todos os processos delicados e sensíveis ao qual o corpo feminino está suscetível durante todos os processos fisiológicos e sociais relacionados ao parto.
Entender o processo histórico relacionado as formas de nascer no Brasil, bem como suas consequências para o corpo da mulher – seja através do aborto, de questionamentos a (falta de) assistência médica, ao surgimento do parto humanizado e ao próprio processo individual feminino na pretensão de gerar a vida – é o que potencializa o espetáculo de forma sutil e linear numa reverência ao corpo que “gesta”, que “pari” e que vai a muito além de suas potencialidade fisiológicas.
Aqui, faz-se uma consideração às mulheres que, nas suas mais variadas dimensões afetivas, éticas, estéticas e políticas, fazem do parto uma forma de se relacionar consigo e com os outros. Cada uma, nas suas particularidades e individualidades de lidar, compreender e se relacionar com o parto nas suas mais variadas formas de subjetividade, traçam diretamente ou indiretamente seu envolvimento com espetáculo na rua.
Para além da forma de se relacionar com a fotografia ou com o teatro, assistir maiêutica traz uma forma de questionamento sobre o parto como um evento para além da fisiologia da mulher, mas como arte do processo de vida de qualquer ser humano, nas suas dimensões mais viscerais, sejam estes mulher ou homem, filha, mãe, doula, obstetra, parteira, ativista, atriz ou quaisquer que sejam suas relações sobre engravidar, dar a luz, cuidar e dar vida. Este espetáculo, parte das nossas dimensões particulares e afetivas e possui de alguma forma, uma grande conexão com nossa vida, com a vida. Este é maiêutica.