Garimpo ilegal na TI Munduruku. Foto: Chico Batata/ Greenpeace Brasil

Invasão de garimpeiros ilegais também é uma grave ameaça a outros povos indígenas além dos Yanomami

Com as atenções do poder Executivo Federal voltada à crise sanitária e humanitária instalada na Terra Indígena Yanomami, em Roraima, outras Terras Indígenas da região Amazônia seguem à deriva do garimpo ilegal, com mulheres e crianças expostas à contaminação e desnutrição.  Em Mato Grosso são mais de 20 terras indígenas que sofrem com a mineração ilegal. 

A Terra Indígena Munduruku, na divisa com o Pará, é uma das mais afetados pela extração ilegal de cassiterita, ouro e diamante. O garimpo contamina a Bacia do Rio Tapajós e tem gerado destruição ambiental sem precedentes. 

Nos últimos anos, um monitoramento inédito com sobrevoos realizados pelo Greenpeace Brasil, revelou que, desde 2016, o garimpo ilegal já destruiu pelo menos 632 quilômetros de rios dentro da TI. Os rios destruídos foram o Marupá, das Tropas, Cabitutu, o Igarapé Mutum, o rio Marupá e o igarapé Joari (conhecido localmente como Joarizal).

O garimpo na região segue ativo. Segundo o monitoramento Sirad-I, 440 hectares de floresta já foram desmatadas no interior do território desde o início de 2022 – 136 hectares só no mês de outubro. Desde 2020, quando a TI começou a ser monitorada, 1,5 milhão de árvores foram derrubadas. 

Assim como na TI Munduruku, a Terra Indígena Zoró, próxima a Rondônia, também está na mira dos garimpeiros. Desde janeiro do ano passado, foram identificados 25 hectares desmatados em decorrência do garimpo ilegal. 

Garimpo no Guaporé entre RO e MT

Na região do Guaporé, a Polícia Federal e o  Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) lutam há anos para também tentar expulsar os garimpos da Terras Indígena Sararé, do povo Nambikwara. Segundo dados do Greenpeace,  entre julho de 2016 e novembro de 2022, foram degradados 340 hectares de área de floresta nativa devido a mineração ilegal, além do assoreamento de cursos d’água, contaminação, desmatamento e mortandade dos peixes nos rios.

Em dezembro, o Ibama desmobilizou 10 acampamentos de garimpeiros e queimou escavadeiras hidráulicas utilizadas no garimpo na TI Sararé, além da apreensão de uma picape e de 88 gramas de ouro. 

A Operação Ferro e Fogo foi realizada em parceria com a Fundação Nacional do Índio (Funai), com a Polícia Federal (PF) e com a Força Nacional de Segurança Pública.

Durante os seis meses iniciais da operação, a estimativa é que o prejuízo ao esquema criminoso já ultrapassou R$5 milhões.

Há três semanas, o garimpo mostrou sinais de que segue ativo. Um homem foi esfaqueado em uma das regiões de lavra dentro da Terra Indígena em 15 de janeiro. 

O Ministério da Justiça e Segurança Pública prorrogou o emprego da Força Nacional de Segurança Pública na TI. A prorrogação foi autorizada pela Portaria nº 284, publicada pelo ministério no Diário Oficial da União em 23 de janeiro. A atuação tem prazo de 60 dias, a serem encerrados em 22 de março, com foco “nas atividades e nos serviços imprescindíveis à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”. 

O estado é o terceiro com a maior extensão de área total minerada, com 25.495 hectares. É o que diz a pesquisa feita pelo MapBiomas, que resulta da análise de imagens de satélite com o auxílio de inteligência artificial.  Mato Grosso fica atrás apenas do Pará (110.209 ha) e de Minas Gerais (33.432 ha). A maior parte da área minerada do estado é ocupada pelo garimpo (22.987 ha). A área ocupada pelo garimpo  cresceu 495% em Terras Indígenas e 301% em unidades de conservação no Brasil entre 2010 a 2020, de acordo com levantamento da rede de pesquisadores MapBiomas publicado em abril de 2022.

O Território Kayapó, no Pará, também sofre com expressivo processo de contaminação, desmatamento, destruição e garimpo ilegal. A TI Kayapó permanece entre um dos territórios com expressivo processo de destruição e abertura de novas frentes de atividades ilegais de garimpo. De janeiro a junho de 2018 foram identificadas mais de 280 áreas desmatadas, de acordo com os Boletins divulgados pelo SIRADX no período.

Febre do ouro ilegal

O estudo “Raio X do Ouro: mais de 200 toneladas podem ser ilegais” aponta que do volume total de ouro com indícios de ilegalidade no Brasil, mais da metade veio da Amazônia (54%), principalmente de Mato Grosso (26%) e do Pará (24%). 

Os casos envolvendo áreas protegidas incluem a TI Sararé (MT), a TI Kayabi/Munduruku (MT/PA) e os Parques Nacionais da Amazônia (PA), Mapinguari (AM/RO), do Acari (AM) e Montanhas do Tumucumaque (AP/PA).

Um documento enviado à Receita Federal pede que a autarquia implante a obrigatoriedade de emissão de notas fiscais eletrônicas, em substituição às elaboradas em papel – inclusive manuscritas –, que ainda são utilizadas para registrar operações de comercialização de ouro do garimpo. Essa medida ajudaria a reduzir a exploração ilegal de ouro e a evasão de divisas. Cabe ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, modificar essa prática. 

Extração ilegal no Pará. Divulgação/Polícia Federal

O Instituo Escolhas já alertava para o fato de o Brasil ter registrado, em 2021, 52,8 toneladas de ouro com graves indícios de ilegalidade, o que equivale a 54% da produção nacional.  “São dois pontos de atenção: primeiro, claro, o aumento expressivo do ouro com indícios de ilegalidade, que evidencia a falta de controle e de ações para coibir a extração de ouro ilegal nos últimos meses. E, em segundo lugar, o fato de que quase dois terços desse ouro vieram da Amazônia. Ou seja, 32 toneladas do metal saíram daquela região com alguma indicação de irregularidade”, afirmava, à época, Larissa Rodrigues, gerente de Portfólio do Instituto Escolhas.

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